quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Dia 27 de setembro: Dia de São Cosme e São Damião - Os Erês


Erê - encontra sincretismo religioso, nas religiões de matriz africana, com os santos católicos São Cosme e São Damião. É o intermediário entre a pessoa e seu Orixá, é o aflorar da criança que cada um guarda dentro de si; reside no ponto exato entre a consciência da pessoa e a inconsciência do Orixá. É por meio do Erê que o Orixá expressa sua vontade, que o noviço aprende as coisas fundamentais do Candomblé - e também na Umbanda - como as danças e os ritos específicos de seu Orixá. A palavra Eré vem do yorubá, iré, que significa "brincadeira, divertimento". Daí a expressão siré que significa “fazer brincadeiras”. O Erê - não confundir com criança que em yorubá é omodé - aparece instantaneamente logo após o transe do Orixá, ou seja, o Erê é o intermediário entre o iniciado e o Orixá. Durante o ritual de iniciação, o Erê é de suma importância, pois é o Erê que muitas das vezes trará as várias mensagens do Orixá ao recém-iniciado.

Oferenda a Cosme, Damião e Doum - Festa: dia 27 de setembro

Para agradar os Erês, no dia de São Cosme e Damião, é fácil. Um pequeno agrado a estes Orixás podem fazer nossas vidas mais felizes. As crianças do espaço, em sua aparente fragilidade, na verdade tem poderes incríveis. A Ibejada pode curar doenças do corpo, da mente e da alma, além de que alegria advinda de uma criança é a mais pura existente na natureza. Puro amor.  Não deixe este dia passar, sem aproveitar a oportunidade para obter graças e agradecer as já recebidas. Os elementos para esta entrega são simples: uma fatia de bolo (e/ou doces), 7 velinhas azuis, 7 velinhas cor-de-rosa, uma garrafinha de bebida doce gasosa (ou suco adoçado tipo capilé) e um pratinho de papelão virgem (tipo de festinha infantil). No dia da entrega, 27 de agosto, é bom estar com pensamentos elevados e corpo purificado. Vá até uma pracinha, qualquer uma, de preferência onde tenham brinquedos (balança, gangorra...). Pense em São Cosme e Damião, e nas crianças, enquanto coloca o pratinho com os doces no chão; em volta coloque as velas, uma azul outra rosa, até dispor todas as 14 velas (pode-se também usar simplesmente uma azul outra rosa); abra o refrigerante ou suco e despeje em torno, em forma circular, a seguir acenda as velas e cante um ponto e/ou faça uma oração aos Cosminhos. Pronto!
Reverencie a entrega, bata palmas, vire-se e vá embora sem olhar para trás. Está feito!

Saravá São Cosme e Damião! Salve as crianças! Erê!

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Umbanda e a Imortalidade da Alma


A Umbanda acredita na imortalidade da alma, ou seja, crer nas sucessivas encarnações e consequentemente nas leis cármicas. Por estas razões, supõe-se que o umbandista é um ser esclarecido de que errou no passado e de que está nesta vida em busca de sua melhoria, de sua evolução. Mas como se dá esta evolução?

A evolução humana acontece todos os dias, diante das mais diversas situações. A todo instante o indivíduo tem a possibilidade de pensar nas falhas e nos erros que comentem consigo e que com lhes rodeia, a partir de então, consciente de que precisa evoluir para não ter que voltar a Terra com a intenção de pagar pelas mesmas faltas, este pode começar a ser uma pessoa melhor.

É essencial que um verdadeiro umbandista não guarde mágoas, que saiba perdoar, que ajude no que puder ao seu próximo – ainda que seja por uma palavra amiga, um por um gesto de carinho sincero, com a verdade dita por vezes dolorosa para melhoria de quem necessita, respeitando opiniões opostas, e, principalmente, pedindo ao Alto a autêntica fé e caridade que apregoa.

O orgulho de não reconhecer o próprio erro, a vaidade de se sentir melhor do que os outros, a inveja de não ter algum bem material ou algum atributo na alma de alguém de seu círculo de amizade ou até religioso, destrói qualquer real sintonia com as Entidades de Luz. Os médiuns de incorporação devem ter maior responsabilidade quanto a esses cuidados com o espírito, pois quando não estão em verdadeira sintonia com os Guias de Luz, no ato de suas incorporações falam de suas bocas os que às Entidades jamais falariam, sendo assim, pagarão mais caro por ludibriar o semelhante que vai de boa fé a procura de auxílio.

As leis cármicas servem para todos: babalorixás, yalorixás, filhos de santo, ogâs, cambones e para os seguidores da umbanda que não têm necessariamente a mediunidade aflorada. Cada um dos citados são filhos do mesmo Deus, portanto, os castigos e recompensas lhes servem igualmente.

Muito se engana quem achar que as consequências de seus atos (castigos ou recompensas) só serão ajustados nas próximas encarnações. Basta olhar ao redor de si e notar que muitos de seus pedidos desta encarnação não vão para frente, não vingam, não acontecem... Nada mais é do que a falta de merecimento por sua má conduta nesta e em outras vidas e o esquecimento de que deve se melhorar a cada segundo de sua existência terrena. Já outros, são abençoados e vivem em paz - fruto de seus comportamentos íntegros e evolutivos.

Valéria Fernandes

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Umbanda: Uma religião brasileira

PAI ZÉLIO FERNANDINO DE MORAES 
Pintado pelas mãos de Claudio Gianfardoni

A ORIGEM DA UMBANDA
15 DE NOVEMBRO DE 1908
ZÉLIO DE MORAES E 
O CABOCLO DAS SETE ENCRUZILHADAS
A primeira manifestação de Umbanda com registro histórico é a do Caboclo das Sete Encruzilhadas em seu médium Zélio Fernandino de Moraes em 15 de Novembro de 1908. Assim como a Tenda Nossa Senhora da Piedade, fundada por Zélio de Moraes, é o primeiro Templo de Umbanda registrado no Brasil.
Por isso, os fatos que ali aconteceram são de fundamental importância a todos nós, como fatos que marcam profundamente o nascimento, no Brasil, da Umbanda no plano material.
Zélio Fernandino de Moraes nasceu no dia 10 de Abril de 1892, no distrito de Neves, município de São Gonçalo das Neves - Rio de Janeiro. Filho de Joaquim Fernandino Costa (oficial da Marinha) e Leonor de Moraes.
Em 1908, aos 17 anos, Zélio de Moraes havia concluído o curso propedêutico (ensino médio) e preparava-se para ingressar na escola Naval, a exemplo de seu pai, foi quando fatos estranhos começaram a acontecer na vida dele. Em alguns momentos Zélio de Moraes era visto falando manso, com a postura de um velho, em sotaque diferente de sua região, dizendo coisas aparentemente desconexas. Em outros momentos parecia um felino lépido e desembaraçado, mostrando conhecer todos os mistérios da natureza. Isso logo chamou a atenção da família, preocupada com a situação mental do rapaz que se preparava para seguir carreira militar, os "ataques" se tornaram cada vez mais frequentes.
Assim, Zélio de Moraes foi encaminhado a seu Tio, Dr. Epaminondas de Moraes, médico psiquiatra e diretor do Hospício da Vargem Grande. Após vários dias de observação, não encontrando seus sintomas em nenhuma literatura médica, sugeriu a família que o encaminhasse a um padre, para que fosse feito um ritual de exorcismo, pois desconfiava que seu sobrinho estava "endemoniado".
Foi chamado um outro parente, tio de Zélio, padre católico que realizou o dito exorcismo para livrá-lo da possível "presença do demônio" e saná-lo dos ataques. No entanto este e outros dois exorcismos, acompanhados de outros sacerdotes católicos, não resolveram a situação e as manifestações prosseguiram. Algum tempo depois Zélio de Moraes foi tomado por uma paralisia parcial, a qual os médicos não conseguiam entender. Um belo dia o rapaz levanta-se de seu leito e diz: "amanhã estarei curado" e no dia seguinte começou a andar como se nada tivesse acontecido. 
Um amigo sugeriu encaminhá-lo a recém fundada Federação Kardecista de Niterói, município vizinho a São Gonçalo das Neves onde residia a família Moraes. A Federação era então presidida pelo Sr. José de Sousa, chefe de um departamento da marinha chamado Toque Toque.
Zélio Fernandino de Moraes então foi conduzido a esta Federação no dia 15 de Novembro de 1908, na presença do Sr. José de Sousa, estava ele em meio aos ataques reconhecidos como manifestações mediúnicas. Convidado a sentar-se à mesa logo em seguida levantou-se, contrariando as normas do culto estabelecido pela instituição, afirmou que ali faltava uma flor. Foi até o jardim apanhou uma rosa branca e colocou-a no centro da mesa onde se realizava o trabalho.
Frei Gabriel de Malagrida
Uma das encarnações do
Caboclo das Sete Encruzilhadas
Sr. José de Sousa, que possuía também a clarividência, verificou a presença de um espírito manifestado através de Zélio de Moraes e passou ao dialogo a seguir:
Sr. José: Quem é você que ocupa o corpo deste jovem?

O espírito: Eu? Eu sou apenas um caboclo brasileiro. 
Sr. José: Você se identifica como caboclo, mas vejo em você restos de vestes clericais. 
O espírito: O que você vê em mim, são restos de uma existência anterior. Fui padre, meu nome era Gabriel de Malagrida, acusado de bruxaria fui sacrificado na fogueira da inquisição por haver previsto o terremoto que destruiu Lisboa em 1755. Mas em minha última existência física Deus concedeu-me o privilégio de nascer como um caboclo brasileiro. 

Sr. José: E qual é seu nome?



Caboclo das Sete Encruzilhadas
Pintado pelo médium Jurandir da
Tenda Espírita N.Sª da Piedade
O espírito: Se é preciso que eu tenha um nome, digam que eu sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, pois para mim não existirão caminhos fechados. Venho trazer a Umbanda uma Religião que harmonizará as famílias e que há de perdurar até o final dos séculos. 
E no desenrolar da conversa Sr. José pergunta ainda se já não existem religiões suficientes, fazendo inclusive menção ao Espiritismo. 

O espírito: Deus, em sua infinita bondade, estabeleceu na morte, o grande nivelador universal, rico ou pobre poderoso ou humilde, todos tornam-se iguais na morte, mas vocês homens preconceituosos, não contentes em estabelecer diferenças entre os vivos, procuram levar estas mesmas diferenças até mesmo além da barreira da morte. Por que não podem nos visitar estes humildes trabalhadores do espaço, se apesar de não haverem sido pessoas importantes na Terra, também trazem importantes mensagens do além? 

Porque não aos Caboclos e Pretos Velhos? Acaso não foram eles também filhos do mesmo Deus?... Amanhã, na casa onde meu aparelho mora, haverá uma mesa posta a toda e qualquer Entidade que queira ou precise se manifestar, independente daquilo que haja sido em vida, todos serão ouvidos, nós aprenderemos com aqueles espíritos que souberem mais e ensinaremos aqueles que souberem menos e a nenhum viraremos as costas a nenhum diremos não, pois esta é à vontade do Pai.

Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade
Sr. José: E que nome darão a esta Igreja? 


O espírito: Tenda Nossa Senhora da Piedade, pois da mesma forma que Maria ampara nos braços o filho querido, também serão amparados os que se socorrerem da Umbanda.


No dia seguinte, na rua Floriano Peixoto, 30 – Neves – São Gonçalo – RJ, próximo das 20:00 horas, estavam presentes membros da Federação Espírita, parentes, amigos, vizinhos e uma multidão de desconhecidos e curiosos. Pontualmente às 20:00h o Caboclo das Sete Encruzilhadas incorporou e com as palavras abaixo iniciou seu culto:
“Vim para fundar a Umbanda no Brasil, 

aqui inicia-se um novo culto em que os espíritos de Pretos Velhos africanos e os Índios nativos de nossa terra, poderão trabalhar em benefícios dos seus irmãos encarnados, qualquer que seja a cor, raça, credo ou posição social. A prática da caridade no sentido do amor fraterno, será a característica principal deste culto”.

Pai Antonio, Entidade que trouxe o
1º Ponto Cantado da Umbanda e
também os 1º elementos a serem usados
nos Trabalhos: o cachimbo e a guia.
A seguir o 1º Ponto Cantado em
um Terreiro de Umbanda
(Tenda Espírita N.Sª da Piedade):

Minha cachimba tá no toco
Manda muréque buscá
Minha cachimba tá no toco
Manda muréque buscá

No alto da derrubada
minha cachimba ficou lá
No alto da derrubada
minha cachimba ficou lá...
Após trabalhar fazendo previsões, Passe e Doutrina, informou que devia se retirar, pois outra Entidade precisava se manifestar. Após a “subida” do Caboclo incorporou uma Entidade reconhecida como Preto Velho, saindo da mesa se dirigiu a um canto da sala onde permaneceu agachado. Sendo questionado o porquê de não ficar na mesa respondeu: - Nego num senta não meu sinhô, nego fica aqui mesmo! Isso é coisa de sinhô branco e nego deve arespeitá! após insistência ainda completou: - Num carece preocupá não! Nego fica no toco que é lugar de nego! E assim continuou dizendo outras coisas mostrando a simplicidade, humildade e mansidão daquele que trazendo o estereótipo do Preto Velho se fez identificar como Pai Antônio. Logo cativou a todos com seu jeito, ainda lhe perguntaram se ele não aceitava nenhum agrado, ao que respondeu: - Minha cachimba, nego qué o pito que deixou no toco, manda muréque buscá! Todos ficaram perplexos, estavam presenciando a solicitação do primeiro elemento material de trabalho dentro da Umbanda. Na semana seguinte todos trouxeram cachimbos que sobraram diante da necessidade de apenas um para Pai Antônio. Assim o cachimbo foi instituído na linha de Pretos Velhos, sendo também ele a primeira Entidade a pedir uma guia (colar) de Trabalho. 

O pai de Zélio de Moraes frequentemente era abordado por pessoas que queriam saber como ele aceitava tudo isso que vinha acontecendo em sua residência, sua resposta era sempre a mesma em tom de brincadeira respondia que preferia um filho médium ao lugar de um filho louco.
Gongá de Pai Antonio, em Boca do Mato,
Cachoeiras de Macacú - R.J.
Foi um trabalho árduo e incessante para o esclarecimento, difusão e sedimentação da Religião de Umbanda. Enquanto Zélio de Moraes esteve encarnado foram fundadas mais de 10.000 Tendas. Após 55 anos de atividade entregou, a direção dos trabalhos da Tenda Nossa Senhora da Piedade a suas filhas Zélia e Zilméia. Mais tarde, junto com sua esposa Maria Izabel de Moraes, médium ativa da Tenda e aparelho do Caboclo Roxo fundou a Cabana de Pai Antônio no distrito de Boca do Mato, município de Cachoeira do Macacú – RJ.



Pai Antonio incorporado em 
Zélio de Moraes na 
Cabana de Pai Antonio, 
em Cachoeiras de Macacú - R.J.




Zélio Fernandino de Moraes 
desencarnou no dia 
03 de Outubro de 1975
Palavras do Caboclo das Sete Encruzilhadas

"A Umbanda tem progredido e vai progredir. É preciso haver sinceridade, honestidade e eu previno sempre aos companheiros de muitos anos: a vil moeda vai prejudicar a Umbanda; médiuns que irão se vender e que serão, mais tarde, expulsos, como Jesus expulsou os vendilhões do Templo. O perigo do médium homem é a consulente mulher; do médium mulher é o consulente homem. É preciso estar sempre de prevenção, porque os próprios obsessores que procuram atacar as nossas Casas fazem com que toque alguma coisa no coração da mulher que fala ao Pai de Terreiro, como no coração do homem que fala à Mãe de Terreiro. É preciso haver muita moral para que a Umbanda progrida, seja forte e coesa. 

Umbanda é humildade, amor e caridade - esta a nossa Bandeira. Neste momento, meus irmãos, me rodeiam diversos espíritos que trabalham na Umbanda do Brasil: Caboclos de Oxósse, de Ogum, de Xangô. Eu, porém, sou da Falange de Oxósse, meu pai, e não vim por acaso, trouxe uma ordem, uma missão. Meus irmãos: sejam humildes, tenham amor no coração, amor de irmão para irmão, porque vossas mediunidades ficarão mais puras, servindo aos espíritos superiores que venham a baixar entre vós; é preciso que os aparelhos estejam sempre limpos, os instrumentos afinados com as virtudes que Jesus pregou aqui na Terra, para que tenhamos boas comunicações e proteção para aqueles que vêm em busca de socorro nas Casas de Umbanda. 

Meus irmãos: meu aparelho já está velho, com 80 anos a fazer, mas começou antes dos 18. Posso dizer que o ajudei a casar, para que não estivesse a dar cabeçadas, para que fosse um médium aproveitável e que, pela sua mediunidade, eu pudesse implantar a nossa Umbanda. A maior parte dos que trabalham na Umbanda, se não passaram por esta Tenda, passarão pelas que safram desta Casa. 

Tenho uma coisa a vos pedir: se Jesus veio ao planeta Terra na humildade de uma manjedoura, não foi por acaso. Assim o Pai determinou. Podia ter procurado a casa de um potentado da época, mas foi escolher aquela que havia de ser sua mãe, este espírito que viria traçar à humanidade os passos para obter paz, saúde e felicidade. Que o nascimento de Jesus, a humildade que Ele baixou à Terra, sirvam de exemplos, iluminando os vossos espíritos, tirando os escuros de maldade por pensamento ou práticas; que Deus perdoe as maldades que possam ter sido pensadas, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Fechai os olhos para a casa do vizinho; fechai a boca para não murmurar contra quem quer que seja; não julgueis para não serdes julgados; acreditai em Deus e a paz entrará em vosso lar. É dos Evangelhos. 

Eu, meus irmãos, como o menor espírito que baixou à Terra, mas amigo de todos, numa concentração perfeita dos companheiros que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste Templo de caridade, encontreis os caminhos abertos, vossos enfermos melhorados e curados, e a saúde para sempre em vossa matéria. 

Com um voto de paz, saúde e felicidade, com humildade, amor e caridade, sou e sempre serei o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas".

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Possessão




O cavalheiro doente, na pequena fila de quatro pessoas que haviam comparecido à cata de socorro, parecia incomodado, aflito...
Articulava palavras que eu não conseguia registrar com clareza, quando o irmão Clementino, consultado por Áulus, disse, cortês, para o Assistente:
- Sim, já que o esforço se destina a estudos, permitiremos a manifestação.
Percebi que o nosso orientador solicitava alguma demonstração importante.
Convidados pelo instrutor, abeiramo-nos do moço enfermo que se fazia assistir por uma senhora de cabelos grisalhos, sua própria mãezinha.
Atendendo às recomendações do supervisor, os guardas admitiram a passagem de uma entidade evidentemente aloucada, que atravessou, de chifre as linhas vibratórias de contenção, vociferando, frenética:
- Pedro! Pedro!...
Parecia ter a visão centralizada no doente, porque nada mais fixava além dele. Alcançando o nosso irmão encarnado, este, de súbito, desfecha um grito agudo e cai desamparado.
A velha progenitora mal teve tempo de suavizar-lhe a queda espetacular.
De imediato, sob o comando de Clementino, Silva determinou que o rapaz fosse transferido para um leito de câmara próximo, isolando-o da assembléia.
Dona Celina foi incumbida do trabalho de assistência.
Junto dela acompanhamos o enfermo com carinhoso interesse.
As variadas tarefas do recinto prosseguiram sem quebra de ritmo, enquanto nos insulávamos no aposento para a cooperação que o caso exigia.
Pedro e o obsessor que o julgava parecia agora fundidos um no outro.
Eram dois contendores engafinhados em luta feroz.
Fitando o companheiro encarnado mais detidamente, concluí que o ataque epilético, com toda a sua sintomatologia clássica, surgia claramente reconhecível.
O doente trazia agora a face transfigurada por indefinível palidez, os músculos jaziam tetanizados e a cabeça, exibindo os dentes cerrados, mostrava-se flectida para trás, enquanto que os braços se assemelhavam a dois galhos de arvoredo, quando retorcidos pela tempestade.
Dona Celina e a matrona afetuosa acomodaram-no na cama e dispunham-se à prece, quando a rigidez do corpo se fez sucedida de estranhas convulsões a se estenderem aos olhos que se moviam em reviravoltas continuas.
A lividez do rosto deu lugar à vermelhidão que invadiu as faces congestas.
A respiração tornar-se angustiada, ao mesmo tempo que os esfíncteres se relaxavam, convertendo o enfermo em torturado vencido.
O insensível perseguidor como que se entranhara no corpo da vítima.
Pronunciava duras palavras, que somente nós outros conseguíamos assinalar, de vez que todas as funções sensoriais de Pedro se mostravam em deplorável inibição.
Dona Celina, afagando o doente, pressentia a gravidade do mal e registrava a presença do visitante infeliz, contudo, permanecia alerta de modo a manter-se, valorosa, em condições de auxiliá-lo.
Anotei-lhe a cautela para não se apassivar, a fim de seguir, por si própria, todos os trâmites do socorro.
Bondosa, tentou estabelecer um entendimento com o verdugo, mas em vão.
O desventurado continuava gritando para os nossos ouvidos, sem acolher-lhe os apelos comovedores.
- Vingar-me-ei! Vingar-me-ei! Farei justiça por minhas próprias mãos!... – bradava, colérico.
Repreensões injuriosas apagavam-se na sombra, porquanto não conseguiam exteriorizar-se através das cordas vocais da vítima, a contorcer-se.
Permanecia o cavalheiro plenamente ligado ao algoz que tomara de inopino. O córtex cerebral apresentava-se envolvido de escura massa fluídica.
Reconhecíamos no moço incapacidade de qualquer domínio sobre si mesmo.
Acariciando-lhe a fronte suarenta, Áulus informou, compadecido:
- É a possessão completa ou a epilepsia essencial.
- Nosso amigo está inconsciente? – aventurou Hilário, entre a curiosidade e o respeito.
 
Livro: “Nos Domínios da Mediunidade” Psicografia: Francisco Candido Xavier. Pelo espírito: André Luiz