O estudo contínuo dos assuntos relacionados à mediunidade na Umbanda
remove dentre seus seguidores dezenas, quiçá centenas, de crendices, costumes e
hábitos que têm se mostrado nocivos à própria Religião. Muitos
umbandistas têm uma visão deturpada do que significa o dom mediúnico em suas
vidas e dentro dos terreiros. Centenas de adeptos desenvolvem uma mediunidade
repleta de entendimento errôneo, suposições equivocadas e vícios comuns a
pessoas que pouco, ou quase nenhum, acesso têm à informação. Muitos desses
equívocos são provocados justamente pelo desconhecimento. Os maus hábitos
acumulam-se ao longo do tempo e transformam-se em vícios que necessitam de
tratamento imediato. Os erros acontecem aos montes causando muito desconforto
aos Caboclos de Aruanda, que vez por outra precisam intervir para remediar a
situação.
A culpa de tais problemas poderia ser atribuída a muita gente: Chefes de
Terreiro despreparados, médiuns afoitos ou de pouca instrução, seguidores pouco
compromissados com a religião, dirigentes desinteressados e até mesmo Espíritos
desencarnados causadores de demandas. A realidade mostra, porém, que a maior
causa de todos os problemas que afetam a missão do umbandista é unicamente a
falta de estudo. Sem o mínimo conhecimento de tudo o que envolve o mecanismo da
mediunidade, assim como em muitos outros aspectos da vida comum, os erros
grosseiros e infantis acontecem em profusão. A mediunidade, a partir de uma
prática sem base teórica, tende a ser conduzida como um brinquedo nas mãos de
infantes.
A mediunidade não é superstição. Partindo da premissa de que deve ser
exercitado numa perfeita união entre a Fé e a Sabedoria, o dom mediúnico
transforma-se em valioso instrumento de propagação das verdades espirituais. De
outra forma, a mediunidade equivocada é conduzida do mesmo jeito como o
adivinho faz com as entranhas de um animal. Não há verdades. Tudo é subjetivo e
enganoso. Falta ciência e sabedoria.
A mediunidade supersticiosa transforma os Guias Espirituais
em oráculos domésticos, onde os mais ínfimos problemas de ordem inferior são
levados em conta. Assim, o Preto Velho passa a ser o informante da traição de
um marido ou do futuro econômico de um filho carnal. O Caboclo, por sua vez,
transforma-se em ajudante fiel dos negócios ou aquele que vai vencer um inimigo
de desafeto. Na mesma proporção, o Exu abandona a condição de Guardião e assume
o papel de vingador ferrenho, ou um escravo à disposição do médium. A Pomba
Gira, sob a mesma ótica, é tida como uma prostituta arrependida e por isso
mesmo obrigada a arranjar parceiros para pessoas de moral duvidosa.
A mediunidade não é show pirotécnico onde o que se vê são rápidos e
ilusórios lampejos de brilhos multicoloridos. O médium sem instrução transforma
o dom em ótimo artifício na exibição de espetaculares manobras que mais chamam
a atenção dos curiosos e dos seres trevosos do que dos Espíritos de Luz. Assim,
tudo é espantoso e deslumbrante. Todos os gestos do médium em transe são
inchados de exageros. Todas as receitas de oferendas são idênticas às listas de
um estranho guisado. Os pontos riscados transformam-se numa mandala confusa de
desenhos e rabiscos infantis sem fundamento. As brancas vestes sacerdotais
assumem a aparência de fantasias carnavalescas em que imperam o luxo, a vaidade
e o exibicionismo.
Na mediunidade pirotécnica, vale mais a grosseira presença
física do médium do que a suave e discreta participação dos Guias de Luz. O
Preto Velho se esconde, o Caboclo se afasta, o Exu ri do fanfarrão e o médium
se exibe. Neste tipo de condução da mediunidade há uma completa falta de força
espiritual, pois a carne assume todas as funções do medianeiro e o animismo, a
mistificação e a charlatanice estão em primeira linha.
Entre tantas formas de se exercitar a mediunidade há também a que leva
em conta a ascensão social do médium. É a mediunidade interesseira.
A mediunidade interesseira é aquela em que as reais
intenções do indivíduo são quase desconhecidas. Há muitos interesses em jogo, e
o principal é o de “subir” na vida. O médium intenciona ser aplaudido, então
usa a mediunidade para chamar a atenção da platéia. O médium quer obter
dinheiro de forma menos trabalhosa, então comercializa o dom. Se tem interesse
em reconhecimento público, então transforma a mediunidade em degrau para a
subida aos palanques políticos, aos palcos da mídia e aos púlpitos das câmaras
e agremiações. Tal como o médium pirotécnico, o médium interesseiro quer
aparecer, mas com o fim certo de obter algum rendimento financeiro.
Nesse tipo de mediunidade, o indivíduo não se envergonha ao “pedir” o
pagamento pelo serviço prestado. Seu rosto não enrubesce quando dita o valor
daquilo que vergonhosamente chama de caridade. Se precisar usar uma máscara,
certamente o fará. Mas, em seu tempo, lançará por terra a fantasia e mostrará
sua verdadeira e tenebrosa face. Como o lobo entre os cordeiros.
A mediunidade ignorante é exercida pelos que
verdadeiramente têm grande aversão ao estudo e à meditação. Nessa modalidade, o
médium conscientemente classifica o estudo contínuo como algo desnecessário.
Acredita que somente as instruções dos Caboclos já são suficientes para que ele
seja um grande instrumento da Comunidade Espiritual. A leitura, a pesquisa e o
conhecimento dos mecanismos mediúnicos são coisas sem importância na visão dos
ignorantes.
Neste caso, o médium não se importa em cometer diversos absurdos em nome
de Deus, pois não há o conhecimento do que realmente é a vontade divina. Fala,
mesmo usando conversações aparentemente profundas, do mesmo jeito como discursa
um simples camponês acerca do universo astronômico. Age sempre de forma
impensada, ainda que com a maior boa vontade. Suas ações são completamente sem
método, critério ou planejamento. Tem uma visão do mundo espiritual como seus
antepassados que outrora atribuíam ao relâmpago um castigo dos deuses ou aos
abalos sísmicos uma demonstração da ira divina. Na mediunidade ignorante quanto
menos se estuda, mais se erra.
Ser instrumento da Espiritualidade Maior é uma benção recebida por
muitos. Porém, como qualquer instrumento necessita de um aprimoramento e de
ajustes constantes, assim é o médium de Umbanda a serviço dos Caboclos e Pretos
Velhos.
Não basta ter mediunidade. Mas, é importante que esta seja útil aos
interesses do Criador, pois todo médium é um depositário da confiança de Deus.
Para ser útil, a mediunidade tem que estar firmada nas instruções que vêm do
Alto.
Bom seria se todos os médiuns aplicassem a sabedoria e o conhecimento no
aperfeiçoamento da mediunidade e se o estudo continuado fosse uma prerrogativa
para um perfeito ministério mediúnico.
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